
O DISTANCIAMENTO E AS NOVAS (OU VELHAS) FORMAS DE NOS RELACIONARMOS
Aviso: esse texto é uma reflexão e não tem uma resposta ou uma opinião formada sobre a situação que trato aqui. É uma provocação sobre como temos nos relacionado com outras pessoas – e não só com elas, mas com tudo à nossa volta.
Quantas vezes já entramos em relações (de qualquer tipo) sem saber praticamente nada sobre a outra pessoa? Arrisco dizer que já fizemos isso, ao menos, uma vez na vida – e acredito que passamos de uma com facilidade. Muitos encontros e contato físico, mas pouca conversa, pouco interesse e pouca troca verdadeira.
Balada, cinema, barzinho, restaurante, casa de um, casa de outro.
As relações perderam a essência e viraram só distração e sexo?
Entramos em uma relação (não só um namoro, mas de qualquer tipo que exista entre duas pessoas) esperando que aquilo supra nossas necessidades daquele momento e, quando nos satisfazemos ali, mudamos. Olha, não tô dizendo pra gente se manter em algo que não nos faz bem ou que não combine com a gente, de forma alguma (e podemos falar sobre esse assunto em outro momento). E nem que só devemos nos relacionar pra namorar e casar (não mesmo). Então, o que será que estamos procurando que não conseguimos encontrar em ninguém? “Ninguém mais presta” você pode estar pensando. Mas, será que sabemos o que estamos procurando?
Em tempos de distanciamento tivemos que nos expor mais – e eu não tô falando de nudes e sexo virtual. Tô falando de expor quem somos, nossos pensamentos, vontades, problemas, opiniões, gostos, o que queremos. Tivemos que conversar, já que não podemos nos encontrar. Isso me levou lá pros anos 2000 e pouquinho, quando as conversas rolavam por horas e horas (e mais horas) no falecido MSN.
Aquela sensação adolescente de estar online, o frio na barriga, a coragem de falar com alguém, de mostrar o que você quer. Falar das músicas que você curte, o que você tá comendo, seu filme ou série preferidos, os lugares que você frequenta. Falar sobre você, quem você é. E, claro, “ouvir” tudo isso da outra pessoa também. #saudades
Era muito mais sobre conhecer alguém do que apenas estar com alguém – era preciso muita criatividade e vontade pra estar ali por tantas horas, conversando com a mesma pessoa.
“É o acolhimento e a escuta que nos trarão a sensação de sermos amados”
Com o tempo e a idade, as relações e os ambientes tomaram novas formas. Tudo ficou mais intenso e, ao mesmo tempo, mais superficial. Quem vai pro rolê pensando em encontrar alguém pra conversar? Aquela pessoa que conhecemos hoje, já conhece nossos amigos amanhã, tá na nossa casa semana que vem, e aí, engatamos algo que dura… alguns meses. Até que cansamos.
“A gente não tem nada a ver”. “A gente não gosta das mesmas coisas”. “Eu não conhecia a pessoa de verdade”. E tantas outras coisas que dizemos ao encerrar essa relação – que por algum tempo parecia o sonho da nossa vida.
Será que se tivéssemos dado a chance de conhecer um ao outro lá no começo as coisas poderiam ter sido melhores? Ou, pelo menos, poderíamos ter entendido tudo isso um pouco antes de causar o sofrimento do fim?
Talvez os aplicativos de relacionamento viessem cumprindo esse papel de nos fazer conhecer alguém, minimamente, antes de realmente nos envolvermos. Posso estar falando besteira, já que nunca usei e namoro há 8 anos, mas a impressão que tenho e pelo que ouço das minhas amigas é a de que ali você tem a possibilidade de alguma troca e um pouco de conversa antes de “curtir” ou “não curtir” alguém e se envolver.
Calma! Eu não tô falando que não podemos ter sexo por prazer, nem trocar nudes e nem reinventar formas de nos relacionarmos virtualmente – desde que isso seja o que você quer. O que eu quero trazer é o olhar de que o distanciamento tem nos dado a chance de realmente conhecermos pessoas – até aquelas que estão mais próximas e, talvez, as que morem com a gente.
Por experiência própria, a distância trouxe mudanças (positivas) pro meu relacionamento (não moramos juntos). Foi um momento de busca por algo que estava sendo perdido, evitado, ou que não julgávamos necessário. Foi tempo de reflexões importantíssimas para que pudéssemos resgatar coisas que vínhamos deixando para trás. Pudemos nos reconectar e alinhar expectativas, abrindo espaço para melhorias e novas experiências.
Dentro de casa, com a família, também foi momento de mais paciência um com o outro. De ajustes, pedidos, conversas. De reinventar e se adaptar. E olha, moramos todos juntos na mesma casa há 20 anos (idade do meu irmão mais novo). Seres humanos têm a necessidade de serem ouvidos, se conectarem e se sentirem amados. E essa troca e conexão só podem ser verdadeiras se dermos a chance de conhecermos uns aos outros, expondo nossa visão de mundo e ouvindo a do outro. É o acolhimento e a escuta que nos trarão a sensação de sermos amados.
O distanciamento fez a gente (re)ver e (re)aprender muitas coisas. Tomara que ele também tenha feito a gente buscar por conexões mais verdadeiras e mais reais.